Sem uma nuvem no céu. Na verdade, nem sol havia quando saí para a corrida de uma hora e meia, ainda sob a luz tímida dos postes e de uma única estrela que insistia em se prender ao azul.
O ato de madrugar nunca é bom – afinal, o sono mais forte é sempre o que não quer acabar. Mas depois que você força o corpo a se mexer, se troca, desde o elevador e abre os olhos de verdade, esse horário antes do sol nascer é perfeito.
Primeiro porque você começa naquele momento de pausa completa no tempo, algo importante em uma cidade como Sampa: a noite já se encerrou, mas o dia ainda não deu sequer um sinal de vida. São raros os carros que já seguem apressados, praticamente não há pedestres (exceto alguns corredores) e até o cheiro muda.
De som, apenas o da respiração ritmada e o dos passos. Sem música – ao menos por hoje.
E assim o dia começou cedo, endorfinado pela corrida e pela paisagem, em um treino com tempo run mais longo que, mesmo tendo o objetivo de ser mais puxado, acabou até leve.
Corrida é assim mesmo: depende do dia. Tem dia que as pernas parecem pesadas, tem dias que elas parecem voar. E tem dias que tudo parece estar em sincronia tão grande que 17km praticamente não cansam absolutamente nada. Ao contrário, eles mais inspiram e motivam do que qualquer coisa.
Talvez exista alguma fórmula mágica, alguma combinação perfeita que mescle clima, ausência de nuvens, temperatura amena, motivação, silêncio, bem estar e oxigênio nas medidas exatas, transformando o ato de correr em algo muito mais espiritual do que físico. Deve existir.
Mas pena que nem sempre essa fórmula desce sobre nós, corredores – ao menos com a frequência que buscamos.
Espero que essa espécie de bênção venha, impulsionada pelos cantos de Shosholoza, às 5:30 do dia 1 de junho de 2014, quando o galo cantar a largada de Comrades.
Rumo a Comrades 2022 
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