A (boa) proibição de mp3 players em ultras

Antes de fazer a Two Oceans no ano passado, vi um tweet deles dizendo que usar mo3 players era proibido na prova. De repente, uma onda de pânico surgiu: como seria possível correr 56K, cruzando dois respeitáveis morros, sem nenhuma música, podcast ou qualquer tipo de combustível auditivo para fortalecer a endorfina?

A resposta veio na própria corrida, semanas depois: entrando em maior sintonia com cada passo dado e cada paisagem vista.

Two Oceans me ensinou a correr em silêncio, sem disrupções e aprendendo a mesclar o corpo e mente à paisagem ao redor, composta de mares deslumbrantes, montanhas assustadoras, casas de subúrbio bucólicas e, acima de tudo, a energia de tantos corredores ao redor, cada um com suas próprias metas e histórias de vida.

Em tese, o motivo da proibição de mp3 players em ultras é a segurança: percursos longos nem sempre contam com ruas inteiramente fechadas para carros e volta e meia incluem trilhas que podem ser mais desafiadoras. Ouvir os organizadores e suas instruções de maneira clara, portanto, passa a ser mais relevante.

Mesmo na Two Oceans do ano passado, rajadas de vento que superaram os 50km/h no topo de Chapman’s Peak também geraram tropeços e sinais de cautela que precisaram ser seguidos.

Mas, na prática, o efeito acaba sendo outro. Ainda corro com mp3 player em diversos treinos, geralmente ouvindo podcasta ou audiobooks – mas, sempre que preciso me concentrar mai, entrar em um estado zen, deixo o iphone em casa.

Comrades também tem a proibição de mp3 players – mas, com o nível de hype e energia que emana dessa prova, começando desde cedo com os cantos de Shosholoza, nem passaria pela minha cabeça abafar o clima único da prova com sons artificiais que eu posso ouvir a qualquer hora e em qualquer lugar.

Correr uma ultra, afinal, é o exercício mais zen que eu conheço. Em situações assim, a sintonia com o mundo real passa a ser o melhor combustível de todos.