O sábado foi aberto com 10km de corrida emendados em 52km de bike pela USP. Com chuva, com novas técnicas entrando musculatura adentro, com toda uma intimidade nova sendo adquirida com esse novo esporte.
Quando comecei a correr, anos atrás, penei para fazer um corpo habituado a décadas de sedentarismo aprender que estava na hora dele mostrar aos deuses a que veio. Tudo, absolutamente tudo, era dor.
Cheguei a ter um princípio de lesão no joelho quando li, em algum lugar, a óbvia constatação de que dores crônicas jamais deveriam ser consideradas normais. Se nosso corpo não tivesse sido forjado para correr pelas próprias forças da evolução e da natureza, afinal, como nossa espécie teria sobrevivido às savanas recheadas de leões, leopardos e rinocerontes?
Me lancei em livros e artigos sobre biomecânica de corrida, ignorei dogmas burros cegamente repetidos por assessorias antiquadas, aprendi a entender cada minúscula manifestação do meu corpo.
Aprendi a pisar de maneira mais suave, com o peito do pé, a recrutar os músculos certos nos momentos exatos, a evitar sobrecarregar joelhos, a relaxar para sintonizar genética humana com força da gravidade. Não vou dizer que não houve mais dor: estaria mentindo.
No começo, por exemplo, quando as panturrilhas deixaram o papel de coadjuvantes e passaram a ser, corretamente, protagonistas de cada quilômetro rodado, achei que minhas pernas fossem se dissolver, que entrariam em um processo de autocombustão tamanho o fogo que parecia arder por debaixo da pele.
Mas a dor eventualmente passou – como sempre passam todas as dores de crescimento.
O corpo se acostumou, a musculatura aprendeu a responder e, em anos correndo provas de 20 a 200km, nunca tive uma única lesão séria.
Voltemos, agora, à bike.
Antes de começar as primeiras pedaladas, já mergulhei na Internet à caça de informações sobre biomecânica, postura, posicionamentos. Como teoria pura nunca leva a nada no esporte, passei essas minhas primeiras semanas de treino mais forte dosando cada movimento e instintalizando cada decisão.
Cheguei a sentir uma levíssima pontada no joelho direito, mas rapidamente me autoexaminei, mudei a postura e pronto: ela sumiu.
O sábado, no entanto, me deixou um resíduo de dor na musculatura da coxa esquerda. Coisa nova para mim: nunca havia sentido nada naquela região.
Cheguei em casa, tomei um banho, prossegui o dia e ela evaporou.
Até o longão de ontem, domingo.
Havia 30km planejados para um dia perfeito, com o sol finalmente dando as caras e se dispondo a secar com suas bênçãos as tempestades que castigaram São Paulo por toda a semana.
Mas…
Nos primeiros 10km, o incômodo se reapresentou, afirmando que, em verdade, nunca fora embora. 5km depois, ele virou dor. Mais 5, ele exigiu providências.
Parei.
Chamei um Uber.
Voltei para casa.
Desde que comecei a pedalar de maneira mais intensa, imaginei que essas dores de crescimento, por assim dizer, certamente viriam me fazer uma visita em algum momento.
Bom… elas chegaram.
Mas sejamos positivos: o próprio fato de ser uma dor na musculatura, e não em uma articulação qualquer, é sinal de que o corpo está é começando a responder, a se preparar. É também sinal de que há algo de errado que eu deva estar fazendo, o que requer alguma pesquisa mais aprofundada.
Hora de dar aquela atenção sob medida para o corpo: um pouco de descanso, uma carga crescente de fortalecimento natural e algum tempo para que as coisas se ajeitem.
Sigamos.
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