Shwush, shwush, shwush, shwush…
Fui o primeiro a chegar no Riacho Grande no sábado, ainda antes das seis da manhã.
Ou o segundo: enquanto me empuleirava na bike, um corredor já começava a ensaiar seu longão.
Ignorei.
Segui com o meu: 5 horas previstas para aquele dia em um vai-e-vem já cotidiano.
Shwush, shwush, shwush…
Parecia nem haver pássaros pelo Riacho. Só o som do pedal embalando-se com os quilômetros repetitivos, passeando por morros leves e eventuais luzes de carros querendo acordar o dia.
Acordar o dia.
Mal me segurava no pedal.
Fizera quase seis horas na semana passada, enfrentando as intimidadoras subidas da Estrada de Romeiros. Antes, já deglutira 150K ali mesmo, no Riacho, saindo ainda com uma sensação de integralidade incompatível com os suores pingados pelo caminho.
Mas não sábado.
Sábado eu estava perigosamente flertando com o overtraining.
Estava com sono, muito sono.
Shwush, shwush, shwush, shwush.
No dia anterior, sexta, havia corrido 30K em duas sessões, uma logo cedo e outra no cair da noite. Na quinta, despertara nas estranhamente habituais 4:15 da manhã para pedalar. Na quarta, corrida de noite. Terça, bike cedo. Segunda, corrida. Domingo, 21K a pé pela cidade. Sábado, 130 no pedal por Romeiros. E assim por diante, de frente para trás, indo até janeiro com apenas um bem vindo dia de descanso.
Shwush, shwush, shwush, shwush…
Estava cansado naquele sábado. Exausto.
Não na musculatura, já habituada ao massacre diário: nas pálpebras.
Overtraining, já aprendi, começa com a sensação permanente de sono. Como a que eu estava sentindo desde a terça passada.
Depois migra para o mau humor. Como o da sexta passada.
Depois se metamorfoseia em desmotivação. Como nesse último sábado.
Shwush, shwush, shwush, shwush…
O som do pedal já estava torturante. Quase pesquei, dormindo em movimento. Me sacudi. Parei. Comi algo. Olhei o GPS: havia percorrido apenas 30K. Uma mísera e única hora se passara.
Segui.
Shwush, shwush, shwush, shwush…
Tudo era silêncio. Silêncio e sono.
Acompanhei o relógio quase psicoticamente. Fui e voltei mais uma, duas, três, quatro vezes.
Vi uma carcaça de gambá, inteira quando eu cheguei, se transformar em nada depois de urubus se refestelarem.
Vi ciclistas chegarem e saírem.
Uma hora a mais se passou.
Depois duas.
Mal passara da metade, mas estava desmaiando. Há dias que simplesmente não passam.
Decidi me confortar com a desistência. Precisava apenas fechar quatro horas, somando uns 110km para… digamos… manter a dignidade.
Shwush, shwush, shwush, shwush…
Segundos viraram minutos. Minutos viraram horas. Horas viraram dias.
O tempo engordou tanto que minha irritação passou a caminhar de mãos dadas com meu tão avassalador sono.
Shwush, shwush, shwush, shwush…
Mas, ainda que paquidermicamente lento, ele passou.
110Km.
Parei no carro.
Guardei tudo.
Saí com a sensação oposta à que deveria estar sentindo dado que, no final das contas, fiquei devendo 43 minutos para a planilha: estava aliviado.
Voltei para casa. Mergulhei no banho. Sonambulei-me até a cama.
Há horas que a única coisa que importa é um bom descanso.
Há horas que o corpo entende como deixar claro o estresse no qual está submetido.
Mas faltam dois meses.
Dois míseros meses para a largada do Unogwaja.
Corpo: aguente firme.
Vai valer muito a pena!Parabéns pela dedicação! Enviado do meu Samsung Mobile da Claro
Eu tenho certeza. Mas esse treinamento está sendo a coisa mais difícil que já fiz na vida!