Encontrando o estado quântico

Sempre gostei do silêncio e da solidão. Para mim, são apenas em momentos de total isolamento do mundo externo que se consegue imergir em si mesmo, se observar, se ouvir, se interpretar.

Evolui de pequenas corridas de 5km para ultras justamente por isso: o tempo na rua, acompanhado apenas do som metronômico das minhas próprias passadas, me permitia um mergulho tão denso em mim mesmo que dificilmente qualquer coisa diferente de um sorriso realizado podia aparecer estampado em minha face depois do treino.

E aí, com o Unogwaja de 2018, descobri o ciclismo.

Se correr me permitia criar uma conexão incrível com a terra, pedalar me trazia um inacreditável sentimento de vôo.

Com cadência alta, de 85 a 90 RPM, e velocidades razoáveis, a sensação de vento lambendo o rosto somada ao dinamismo na mudança de paisagens me fez passageiro frequente de um tipo novo de viagem interna, metafísica, zen. Puro estado quântico.

E, como já praticava duas das três modalidades do triathlon, nada mais natural que me aventurar na natação para me inaugurar em um novo esporte.

Igualmente incrível.

Levei um tempo maior, confesso, para transformar o “dar braçadas até a outra ponta da piscina” no “deslizar cortando a lâmina fina da água” – mas, uma vez nesse estado, tudo mudou.

E veja… de repente, do nada, me vejo hoje revezado minhas manhãs e noites sempre suando sobre um dos três caminhos até o paraíso.

Porque seja nadando, pedalando ou correndo, esse teletransporte quântico até um estado mental claramente superior vem já nos primeiros minutos.

É como se eu conseguisse sair de mim mesmo e, em instantes, me transformar apenas em movimento – no mais puro movimento, absolutamente sincronizado com terra, ar ou água, aerodinâmico, flechante, silencioso, metamorfoseado.

Com um bônus valiosíssimo: por serem três diferentes esportes, o corpo nunca está fisicamente destroçado ao ponto de não conseguir praticar nenhum deles. Quando as coxas cansam de pedalar, sempre dá para usar as panturrilhas na corrida; e quando essas também reclamam, sempre é possível trocar pernas por braços e ainda ganhar uma massagem nos membros inferiores feita pela incansável água.

Não digo isso da boca para fora: praticar essas três modalidades tem me deixado com um senso de calma, de tranquilidade, fora do comum. Quando se consegue chegar em um estado quântico, suponho, a vida ganha perspectivas mais amplas – e isso muda tudo.

Não vou dizer que não esteja sentindo nenhuma dor muscular mais tensa: nesse instante, em que passeio pelo pico do treino para o Ironman 70.3 de Maceió (no dia 4 de agosto), estou absolutamente mastigado.

Mas o incrível é que mesmo isso, mesmo toda essa soma de dores espalhadas pelo corpo, não tira um único centímetro de ansiedade a cada noite em que antevejo e me preparo para a endorfina que será gerada na manhã seguinte.

Em que me transformarei de novo de massa, de “coisa”, em movimento, em energia. Em que me sincronizarei com a terra, com a água ou com o ar. Em que viajarei por recantos tão inimagináveis de mim mesmo.

Treinar, assim, decididamente não será nenhum sacrifício.

átomo

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