Já falei, nesse post aqui, sobre o Whoop – uma pulseira que, ao medir 24×7 a variabilidade de batimentos cardíacos, contribui de maneira decisiva com a recuperação muscular. Não vou me repetir sobre o funcionamento do Whoop (novamente, esse post aqui tem tudo) – mas cito algumas de suas principais características:
- HRV (do inglês “heart rate variability”, ou variabilidade de batimento cardíaco) é a chave de todo o conceito. Ele mede a diferença, em milisegundos, entre cada batimento cardíaco. Quanto maior ela for, mais recuperado e inteiro você estará; quanto menor ela for, mais difícil será performar bem. O HRV é depois convertido em uma pontuação de estresse corporal, variando de 0 a 21.
- Os batimentos cardíacos também servem para medir eficiência e qualidade do principal motor de recuperação: o sono. O Whoop mede quanto tempo você passou em cada estágio do sono, a consistência e a qualidade geral, e gera uma pontuação de recuperação.
Meu Whoop chegou na terça e, desde então, passei e mergulhar mais nesse universo.
Disclaimers
Antes de entrar em detalhes sobre o que acabei descobrindo, vale um “disclaimer”: o Whoop ainda está em fase de “conhecimento” do meu perfil. Como tudo nele é personalizado (afinal, HRVs e demais características fisiológicas variam de pessoa a pessoa), há a necessidade de se esperar cerca de 4 dias até que o painel de métricas completo seja estruturado. Eu ainda estou nesse período, aguardando – mas já deu para ter boas noções.
Outro “disclaimer” importante: eu estou, neste instante, fechando o ciclo de treinamento para uma prova intensa, o Ohana Kahi, cuja largada se dará no sábado. Isso significa que o corpo está sob um estresse acumulado significativo e com uma necessidade de descanso importante para que eu chegue inteiro lá em Ubatuba.
O sono
A primeira coisa que acabei descobrindo sobre mim é que a qualidade do meu sono realmente é muito boa, o que facilita uma recuperação mais rápida.
Esses são os indicadores do meu primeiro dia de Whoop, por exemplo:

Das oito horas que passei na cama, dormi efetivamente por 7h44min. Isso dá uma eficiência de 97% – muito, muito alta de acordo com a média. Esses 16 minutos perdidos incluem desde o tempo que levou para eu efetivamente dormir até as perturbações que ocorrem normalmente, ao longo da noite, em que acordamos por períodos mínimos sem sequer nos darmos conta. Em média, essa soma de “momentos acordados” dá algo em torno de 1 hora por noite, com uma quantidade de “perturbações” que chegam a algumas por hora.
Por que isso importa? Porque esses 97% de eficiência são o que garantem a recuperação nas duas frentes:
- Recuperação muscular, que ocorre durante o estágio de sono profundo (SWS Deep), em que passei 2h03
- Recuperação mental, que ocorre durante o estágio REM, em que também sonhamos (1h39)
Ambos os tempos ficaram acima da média, o que é naturalmente muito bom.
O quão puxada é a rotina?
No dia seguinte, a rotina se abriria novamente: natação de manhã, corrida no final da tarde, cotidiano turbulentíssimo no trabalho ao longo do dia e família à noite. Nem eu fazia ideia do volume de estresse que isso tudo gerava para o corpo até ver o gráfico:

A parte inicial do gráfico acima mostra o tempo que eu estava dormindo (com batimentos que chegaram a quase 40bpm); as duas faixas azuis mostram as atividades em si; e o restante, o cotidiano.
No total, meu Strain Score (ou pontuação e estresse) chegou a 20,4 (em uma escala que vai até 21). Apenas a título ilustrativo: em um dos podcasts do próprio Whoop, um grupo de Seals (das forças especiais americanas) contou a história de um desafio que incluiu saltar de um paraquedas em pleno Pacífico, nadar 4km até a costa e depois correr 160km – tudo “vestindo” placas de cerca de 15kg. Eles mediram o Strain Score de todos – que, no pico, chegou a 20,7.
O mais curioso é que já estou tão habituado a essa rotina que nem sinto mais tanto cansaço. Curioso.
Curioso, mas com um preço a ser pago.
E aí veio a minha primeira decisão tomada com base no Whoop.
No dia seguinte – hoje – eu teria 1h40 de pedal a serem rodados as 4 da manhã.
O despertador tocou. Acordei com a sensação de estar mastigado.
Olhei a análise do meu sono no aplicativo do celular: a pontuação de recuperação corporal, que chegou a 96% na manhã anterior, estava em 57%.
Pensei. Minha prova aconteceria em dois dias e, apesar da planilha ser clara em colocar esse como último treino, executá-lo estava me parecendo uma má ideia. Desisti, desliguei o celular e dormi por mais 1h30.
Quando acordei, a mágica estava feita: as dores haviam quase que desaparecido, a eficiência do sono estava em 89% e o score de recuperação estava em 78% – quase 20% a mais que 1h30 antes.

Agora, enquanto escrevo este post, estou me sentindo quase que miraculosamente bem. Ainda tenho um dia de descanso – amanhã – antes da prova, o que certamente me deixará mais disposto, mais inteiro. E, aparentemente, é o que basta: um pouco de descanso no momento certo (ao invés de toda uma fase longa de polimento, como comentei nesse outro post aqui).
E o HRV?
Todos esses dados, vale ressaltar, são fruto da análise do HRV. O HRV em si, nesses últimos dias, permaneceu relativamente alto:

Como ele vai se comportar nos próximos dias – incluindo no período durante e depois da prova – ainda é uma incógnita para mim.
Mas vou postando aqui para acompanhar.
E o TrainingPeaks? Como fica a relação de Whoop vs. TrainingPeaks?
Uma outra conclusão que acabei chegando é a de que, em vários momentos, Whoop e TrainingPeaks serão quase que ferramentas antagônicas – embora ambas sejam importantíssimas.
O TrainingPeaks, afinal, mede a evolução da performance em esportes específicos (no meu caso, natação, ciclismo e corrida). Quanto melhor o equilíbrio entre o estresse imposto ao corpo em cada um desses esportes e o tempo de recuperação, melhor. e isso é medido em TSS, fadiga, fitness, forma etc. Até aí, perfeito.
Mas o TrainingPeaks não leva em consideração o resto do período, a parte imensa do dia em que não estamos treinando. Sob esse aspecto, o Whoop acaba fornecendo dados melhores (até porque um dia estressante no trabalho, por exemplo, certamente impacta – e muito – a performance).
No exemplo desse post, o TrainingPeaks mostra a minha quinta-feira com uma diferença entre fitness e fadiga de apenas 3 pontos TSS: algo quase irrelevante. Por esse mesmo motivo a bike estava marcada para hoje, o que levaria a um descanso de apenas um dia e a uma largada estatisticamente boa.

E esse foi um belo exemplo de teoria (TrainingPeaks) que não correspondeu à prática (Whoop). Aqui, trocar pedal por travesseiro acabou gerando uma recuperação melhor.
Isso serve para tudo?
Nada “serve para tudo”. E uma fase de alta intensidade de treino, onde o objetivo é justamente aprimorar o corpo, submetê-lo a mais estresse é fundamental para que ele “aprenda”. Nesse sentido, as medidas de TSS do TrainingPeaks são inigualáveis: elas realmente mapeiam a evolução como nenhuma outra ferramenta.
Mas, claro, se ficarmos submetendo o corpo a estresse em cima de estresse em cima de estresse, ele eventualmente quebrará (seja em forma de lesão ou de overtraining). É aqui que entra o Whoop – aqui e na fase de descanso para a véspera de uma prova.
Essa primeira impressão do Whoop, portanto, foi realmente incrível. Há ainda toda uma série de indicadores que serão destrancados daqui a algus dias e que mal posso esperar para ver – mas só essas primeiras leituras já fizeram a pulseira valer a pena.